Muito
me inquieta quando em uma conversa o discurso é repleto de saudosismo. Verdade
ou não é que os idosos costumeiramente dizem que as coisas eram muito
diferentes antigamente. Claro que eram, tudo muda! Só de pensar que poderíamos ter
sido amebas, quem dirá o tamanho e sabor do Big Mac.
Longe
de uma análise superficial, o que me inquieta não são os sintomas, mas as
motivações que são com rastros de histórias subordinadas à lembranças de carga afetiva.
Não ignoro o fato que a proximidade da finitude da vida faz florir sem controle
o passado, afinal é ele que dará sentido ao fim que está por vir. Mas não é
exatamente essa a minha questão. A angústia não se manifesta somente na certeza
do fim, mas também na incerteza do que está por vir. Isso talvez explicaria o
discurso saudosista de um adolescente, cujo a morte é distante e
incompreensível.
Embora
nem todas as teorias da psicologia admitem o passado como objeto de estudo, também
não negam que existe nele uma força que, mesmo conhecido, é sustentado pelo seu
mistério.
A
psicanálise entende que a força do que passou irá subordinar o que virá. Acreditamos
que o tempo e as lembranças são o que tornar-se-á, e a isso chamamos de
memória.
O
tempo, inclusive, também é subordinado a lembranças, aliás o tempo se confunde
com ela.
Ouso
até dizer que a felicidade é prisioneira expectadora do tempo, não só a
felicidade, mas também a angústia. Sem a
lembrança, a ansiedade não tem sentido, bem como os sonhos.
Ora, por que falar de tempo? Lembranças? Perceba se não é a memória a força propulsora que molda a nossa identidade. É o que passou, o que vivemos e experimentamos que nos define. O que carregamos, pode, em grande parte, ser o que evitamos.
O
fato, amigos leitores, é que nós somos frutos da construção da memória.
Portanto, o que nós produzimos também o somos. O que se manifesta no tangível tem
a concretude da subjetividade ao longo da história, e, sem menos, a
subjetividade também é consequência da memória.
Que força e essa que me permite escrever e você ler se não a memória?
Vivemos o hoje, assumimos seus conflitos, que só existe, porque houve um passado que se perpetua por meio da memória. Se tememos o futuro, se ele nos pune sem ao menos existir, é porque ali reside a memória.
O que faz o futuro ameaçador se não a ideia de ser um passado em potencial?
Por isso o que carregamos, em grande parte, será o que iremos fugir. Seria então a memória causadora das neuroses?
Se os neuróticos sofrem de reminiscências, como diria Freud, a sanidade psíquica bem que se deve, em alguma coisa, alimentar-se do esquecimento.
E
por que seria o esquecimento e não a memória o antídoto tranquilizador de
nossas neuroses? É o meu passado que me assusta no futuro. O medo de repeti-lo.
O desvio que eu mesmo construí me acompanha, e torna-se conteúdo que se
configuram em projeções mnêmicas.
O prazer está justamente em transgredir o futuro, dizendo a ele: você não me pegou! Fui mais esperto que você! Mas isso é possível? Sim, talvez. Pergunte ao seu passado.
Gustavo
Trevisan.
Estaria então em um surto de amnésia a solução para um dos maiores males da humanidade? A insegurança e o medo do futuro?
ResponderExcluirNão conheço ninguem que tenha tido, mas nos relatos e filmes que já vi, a pessoa gasta cada segundo de seu presente tentando descobrir qualquer fagulha do passsado.
O ser humano tem uma espécie de obcessão por saber de onde veio, como e quando, como se isso fosse fundamental para se definir para onde vou.
Temer o futuro por fatos do passado é fazer mal uso da experiência, da sabedoria, além de um tremendo ato de covardia, e muita falta de fé!
Costumo escrever os pensamentos que me passam a mente, nos momentos mais inusitados, e ontem, coincidentemente, no banheiro do trabalho foi esse que esquevi:
“O que mais me inquieta, não são as águas passadas, mas sim aquelas que ainda hão de rolar!”
Adorei o texto!!! Parabéns!!!